Um ano de pandemia. Um ano funcionando na pandemia. É surpreendente constatar que foi possível. É desconfortante saber que é assim que continuaremos. O que nos sustenta? Onde estamos sustentados para poder realizar esse trabalho?
Não nos encontramos na nossa sede, não estamos em presença uns dos outros. Imagens no ecrã, vozes nos fones. Ainda assim, estamos sustentando nosso laço. Sim, a Psicanálise. Assumimos o compromisso de sustentar sua transmissão. O laço transferencial, o discurso psicanalítico. Pretendemos não ser um grupo de estudos. Denominamo-nos Associação. O que nos associa? O sintoma de cada um, nossas grandes e pequenas diferenças. Narcísicas, sim. Mas, mais do que isso, é o que colocamos aí onde só existe a falta, a interrogação, que nos convoca no mesmo ponto em que nos angustia; e que teria nos fisgado no mesmo anzol, sem fazer de nós um cardume.
Mais um ano em que teremos, de novo, realizado ou não nosso trabalho, fazendo funcionar os dispositivos institucionais. Nosso trabalho via Internet. É uma via e é a que nós temos hoje para insistirmos em instituir a Psicanálise entre nós. E assim, permanecermos fundando, cada um, com seu ato, a cada vez, a AEPM.
O Seminário 6 de Lacan, O Desejo e sua Interpretação, que mais uma vez vamos atravessar, nos interroga sobre o que é o desejo. O que é isso, que coloca o aparelho psíquico em movimento? O abismo para o parlêtre diante do Outro, do desejo do Outro, da falta no Outro. Sujeito barrado do significante que o diria, sendo falado no lugar de sua ex-sistência pelo Outro. Existência fantasmática, tendo sido o objeto que teria obturado o desejo, existência sintomática, sendo a encarnação do compromisso em realizar o desejo. Sujeito evanescendo de novo em um novo significante que passou em sua fala e iluminou o seu rastro. Não sem que aí alguém testemunhe sobre essa passagem e que no a posteriori possa inscrevê-la no fluxo incessante de suas batidas.
E quando o Diabo reverberar Che vuoi?, que da minha janela, da minha moldura, eu possa dizer presente.