Não se trata de boa vontade. Uma frase que ficou ressoando para mim após ter assistido à transmissão do Debate na Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados sobre a Formação dos Psicanalistas e as tentativas de formalização de cursos de graduação em psicanálise. Talvez por ter um exercício profissional em um curso de graduação e por lá ministrar uma disciplina chamada Técnicas Psicanalíticas e também talvez por ter esse exercício interpelado e atropelado pela minha formação na AEPM, fui muito tocado pela transmissão, pelo debate. E pela fala de uma das psicanalistas a qual se remetendo àqueles que estão matriculados nestes cursos citou a seguinte frase (ou algo parecido com isso): “pessoas sem o devido preparo, ainda que tenham boa vontade, podem por um manejo equivocado induzir desastres”. E não é isso que encontramos por todo canto? Desastres realizados até suas últimas consequências em nome da boa vontade? Disso, a psicologia está cheia, as salas do curso se enchem aos montes, todos em nome do “bem”, poucos fazendo uma formação.
Com isso, lembrei que há algumas semanas (ainda nas primeiras semanas do semestre letivo) uma aluna veio até mim e disse que tinha feito uma “loucura”, que tinha se matriculado em outra graduação: na de psicanálise EAD! Ela portava um sorriso no rosto e falava com certo orgulho. Eu me assustei. “Como assim essa bizarrice estava tão perto assim?”. Mas ratifiquei o que ela havia me dito: “realmente é uma loucura!”. Pedi que ela tentasse retomar para si um pouco das coisas que eu falava em sala de aula e afirmei que o curso era uma charlatanice, uma perversidade. Um silêncio, um sorriso murcho, uma boa vontade sendo atingida…
A oferta era boa – a possibilidade de pagar a partir de 262 reais, ou até de não pagar (via ProUni) -, e a promessa, através do discurso falacioso de uma democratização da psicanálise, era melhor ainda: de dar acesso facilmente a ela.
Lembrei da minha época de graduação, quando por alguns instantes, estive indeciso entre a psicanálise e a análise do comportamento. A psicanálise parecia tão difícil, tão distante, tão impossível…. Até hoje não sei o que me fez dar esse passo (posso racionalizar e encontrar várias explicações, mas a verdade é que não sei!). Dar esse passo, no entanto, não é fácil e acho que não tem como ser. O nosso trabalho pode chegar em alguns, mas o passo realmente é de cada um. Poder mostrar isso por onde vamos, eis aí uma face bonita da psicanálise.
A psicanálise tem a sua beleza, mas, certamente, não é boa, não é barata (o que não quer dizer que é preciso ter muito dinheiro para estar nela), e não é fácil (o que não quer dizer que é difícil ou de difícil acesso). E eu me alegro por fazer parte de uma Instituição onde isso não deixa de ser afirmado através de cada um de seus dispositivos de formação e do trabalho de cada um. Acredito que é por eu estar nela, e, obviamente, em análise, que na semana seguinte, a mesma aluna me procurou para dizer que havia cancelado a sua matrícula no tal curso de psicanálise.